Os filhos, os muitos que tivera
e criara não lhe fazia uma visita, não davam um telefonema, nem um cartão para o
vizinho ler para ele. Isso dilacerava o peito dele, largando-o ao abandono e a
depressão. Sentado à mesa com a face entre as mãos, sentia as lágrimas rolaram;
seguidas de um único soluço.
Muitos eram os pensamentos.
Bastante as angústias. Turbado, indagava a si: “Onde foi, meu Deus, que errei?
Que pecados cometi para ser castigado desse jeito? Se não fosse o meu vizinho,
o que seria de mim? Para que tantos filhos?”
Essas indagações rondavam a cabeça
dele e elas mexiam, remexiam o desgosto no mais profundo do peito. Para ele,
não havia sentido algum viver.
No outro dia, o vizinho não o
viu na cadeira, como era de costume. Mas achou que ele poderia estar dentro de casa,
fazendo alguma coisa. A mesma cena se repetiu no dia seguinte. Desconfiado,
chamou o filho e pediu que fosse ver se estava tudo bem com Pedro.
Sem retrucar, atendeu num instante
o pedido do pai. Ao adentrou na casa de Pedro, não o viu na sala. Foi à cozinha
e ele não estava. Ao ir ao escritório, avistou o corpo dele tombado.
Tirou o celular do bolso às
pressas, discou 192. Enquanto a ambulância não vinha, percebeu que havia uma
carta em uma das mãos. Nela, estava escrito: “Aquele que me encontrar, entregue
esta carta a um dos meus filhos. Obrigado”.
Os filhos, quando souberam de
sua morte, pediram que o vizinho tomasse conta do defunto. Dos seis, somente a
mais velha apareceu. Em nome dos demais, agradeceu, pegou a carta deixada pelo
defunto e nem deu importância ao que estava escrito. Estava de olho era nos
bens do finado.
Só que ela foi surpreendida. O
finado só havia deixado metade do que lhe pertencia e de menor valor. A outra
foi destinada para instituições e o vizinho que cuidara dele, sem nunca o
explorar, sem nunca pensar em seus bens.
Não demorou muito para ela riscar
o carro na porta de Fernando, fez aquele escarcéu e saiu queimando pneu,
dizendo impropérios, maldizendo céus e terra; jurando que iria metê-lo na
cadeia por se aproveitar de um idoso.