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Keinha e os bichos

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Lilu Sabe, lá em casa a gente cria duas gatas e um cãozinho como se fosse gente. As gatas se chamam Kika e Tina e o cãozinho, Lilu. Eles estão sempre por perto. Na verdade, quem cuida deles é Keinha. Ela os conhece muito bem. Tininha, por exemplo, é ranzinza e ciumenta. Kika é carente e dengosa. Lilu adora pão com queijo, mas usa corticoide. Está sempre com eles no colo, mas não esconde que Tina é seu xodó. Keinha não se importa de ficar com a roupa cheia de pelos, nem a pele. Sempre conversa com eles. São seus serumaninhos . Teve um dia que ela estava com Tina no colo, apertando-a com afeto. Lilu não gostou daquilo, aí, saltou no colo dela. Estava disposto para disputar o quinhão de amor que lhe pertencia, enchendo-a de lambidas. Tina não gostou dessa ideia. Ronronou para ele. Lilu rosnou. Para acabar com a arenga, Keinha lhes disse: — Parem com isso. Vocês são irmãozinhos. E irmãozinhos não brigam, tentando reaproximá-los. Tina não quis nem saber. Saltou do braço do sof

Sabor de acerola

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Hoje eu ri. Mas a noite não é minha. Foi dela. Quando a vi, meu corpo se inquietou. Teria tantas coisas para dizer a ela. A voz, no entanto, se embargou.  Sem solução, chupei acerola e procurei nas sementes um sabor para mim. 03.06.99

O primeiro gole

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“ Por que, meu Deus, eu tenho que sofrer tanto assim nessa vida? Fui um bom filho. Sempre cumpri com os afazeres que o meu pai mandava e minha mãe. Por que hoje passo por tanto aperto? Sou um homem já idoso. O cansaço tá comigo e não me larga. Não tenho prazer nenhum na vida. Será que tô pagando pelos meus pecados, sofrendo e gastando o resto dos meus dias num barquinho; pegando uma bobagem aqui outro ali, sol, chuva, chuva, sol pra vê se eu arrumo um bocado e uns trocados? Não tenho nenhuma aposentadura. Se não fosse a ajuda do Governo e dos meus filhos que faz um bico aqui outro ali o que seria de mim? O que ganhei nesta vida? Só doença. Só fiz trabalhar feito um condenado. Pra quê? Não sei mais olhar pra os meus filhos. Nunca dei nada a eles, além de sofrimento e apertos. A minha mulher anda me rejeitando. Só anda com a cara feia. Quando eu vou querer um negocinho com ela, ela me dá às costas. Será que ela tá me traindo?”.   Esses conflitos perturbavam Artur .

Foi só um olhar

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Tudo se iniciou no Bar da Galega. Cátia e Frederico escutavam sertanejo por lá. Riam, beijavam-se e bebiam. Sandro entrou, observou as pessoas, cumprimentou alguns conhecidos e olhou de soslaio para ela. Frederico não gostou do modo como eles se olharam. Amarrou a cara na mesa e bebia com ímpeto. Passados alguns minutos, ele chamou Cátia de safada, vagabunda e deu um tapa na face dela. Sandro, sem saber os motivos, foi desapartar a briga. Raivoso, Frederico o empurrou, acusando-o de f l ertar com a mulher dele. Sandro perguntou se ele estava louco, discutiram e os fregueses do bar desapartaram eles. Nisso, Cátia saiu em lágrimas. Inconformado, Frederico foi atrás dela, dizendo: — Prá onde você vai, sua cachorra. Quando chegar em casa, você me paga. Vagabunda. Só vive dando ousadia a todo mundo que ver pela frente. De hoje não passa. Você me paga. Ele conseguiu alcançá-la. Pegou-a pelos cabelos, deu-lhe umas bofetadas e saiu rua a cima. Tinha gente que fingia não ver, ou

Última dor da existência

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Ela estava sentada no batente da porta. Face voltada para a calçada e entre os dedos o cigarro. O cigarro, quando posto entre os lábios, estremecia. Nela havia solidão e o seu mundo estava desarranjado. A mente muitas coisas fazia, participava no cubículo do seu ser. Passavam-se as horas. Passavam pessoas. Só não passava aquela angústia, aquela dor, a última que alguém pode sentir nesta vida. Só o cricrilar fazia-se presente no fechar e abrir dos dias.

A minha gata

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Kika A minha gata vive atrás de mim, toda dengosa. Mas o dengo dela tem explicação: é a fome. A minha outra gata afirma que não é nada disso, mas amor. Acontece que a minha gata faminta quando está com o bucho cheio, me trai. Imagine: ser traído por um bucho cheio! E essa traição arranca risos da outra gata.